RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL: É UM BOM CAMINHO A SEGUIR?

08 de abril de 2020

André Alfredo Duck

Advogado e Sócio da Vacção Carvalho Duck Advocacia

 

No atual cenário econômico pandêmico, muito se tem debatido sobre medidas que podem ser adotadas pelas empresas como instrumentos viáveis para transpor o descompasso no ponto de equilíbrio, o qual, uma vez desbalanceado, ocasiona o acúmulo do passivo.

Dentro do quadro de que inúmeras sociedades empresárias já giravam no negativo, com a pandemia o cenário certamente se agravou, pois com a promulgação das medidas de isolamento que impôs a suspensão das atividades não essenciais e fez com que muitas empresas fechassem as portas ocasionou um impacto negativo na atividade empresarial, e o devedor em crise se vê à beira de um penhasco prestes a cair.

Partindo desta ótica, a Recuperação Extrajudicial, que é uma medida pouco usual no ordenamento jurídico pátrio, se mostra relevante principalmente para que as pequenas e médias empresas suportem a crise e se mantenham em atividade.

Assim, a resposta à pergunta que encampa o título é um impositivo sim.

A Recuperação Extrajudicial possui idênticos requisitos da Recuperação Judicial e cabe ao devedor comprová-los para poder submeter o plano de pagamento à homologação judicial. Sinteticamente, são os seguintes:

      1. Exercício regular das atividades por prazo superior a 2 anos;
      2. Não ser falido ou, caso o for, as responsabilidades estejam declaradas extintas por sentença transitada em julgado;
      3. Não ter obtido Recuperação Judicial há menos de 5 anos;
      4. Não ter obtido concessão de Recuperação Judicial há menos de 8 anos;
      5. Não ter sido condenado por crime falimentar, bem como não possuir administrador ou sócio controlador com condenação às penas previstas na Lei 11.101/2005.

Além destes requisitos comuns ao procedimento judicial, a lei de regência prescreve requisito específico: o devedor não pode pleitear a homologação do plano extrajudicial se está pendente pedido de Recuperação Judicial ou, então, homologação de outro plano extrajudicial há menos de 2 anos.

Outra particularidade deste procedimento é a não sujeição de determinados créditos – tributários, trabalhistas, créditos com garantia fiduciária de bens móveis e imóveis, arrendamento mercantil e contrato de venda com reserva de domínio – mas faculta-se aos credores aderirem voluntariamente ao plano de recuperação extrajudicial.

Desmistificando o procedimento, vê-se que se trata de uma negociação prévia entre devedor e credores, partindo daquele uma proposta de pagamento da dívida com condições flexibilizadas e que se amoldem ao fluxo de caixa da empresa.

Uma vez acordes devedor e credores quanto ao plano de recuperação extrajudicial, caberá ao devedor submeter ao Juízo competente o pedido de homologação, o qual conterá todos os signatários e deve estar acompanhado pelos documentos que comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados para o processamento da Recuperação Extrajudicial.

A título de observação, é vedado o pagamento antecipado das dívidas e o tratamento diferenciado aos credores não aderentes, sob pena de ferir a par conditio creditorum, pois deve prevalecer o tratamento igualitário reservado pela legislação em defesa dos interesses dos credores.

Com o processamento do pedido, as ações e as execuções movidas pelos credores signatários do plano são suspensas por aplicação analógica do art. 6º, § 4º, da Lei 11.101/2005, decorrendo esta conclusão a partir de uma interpretação lógica e contrario sensu do art. 161, § 4º, da lei de regência o qual prescreve que as ações e execuções não se suspendem em relação aos credores não sujeitos e/ou não signatários.

Decorridos os prazos para objeções e manifestações dos devedores, após o atendimento de todas as disposições legais, será proferida decisão homologatória, observando-se aqui que a homologação somente ocorrerá se inexistir fraude, simulação ou a inocorrência de outro fator que impeça que o plano seja homologado.

Tem-se assim que principalmente para as pequenas e médias empresas que já amargavam passivos anteriores à pandemia causada pela SARS-COVI-2, e que se elevaram com a suspensão das atividades não essenciais causando impacto negativo no giro empresarial, é uma medida substancial a ser aplicada como forma de superar a crise econômico-financeira.

Não se olvida admitir que empresas de médio e grande porte também podem – sem sombra de dúvidas – valer-se da Recuperação Extrajudicial, mas vê-se que há um obstáculo justamente no número de credores com quem o devedor deverá negociar previamente, pois é comum constatar em Recuperações Judiciais de média e grande monta atingirem facilmente mais de 100 (cem) credores, ao passo que para uma empresa de menor porte é mais fácil negociar de forma célere com um número significativamente inferior de credores.

Assim, em tempos em que é necessário o diálogo entre devedor e credores como forma de se atingir o mais rápido possível a solvibilidade de uma empresa, a Recuperação Extrajudicial permite que esta, dentro de um plano de pagamento que se enquadre em seu fluxo de caixa, liquide o seu passivo, garantindo então a preservação dos interesses de todos os envolvidos no processo recuperacional.

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