A DESJUDICIALIZAÇÃO DA EXECUÇÃO: SOLUÇÃO PARA A MOROSIDADE?

05 de maio de 2021

O Poder Judiciário, um importantíssimo pilar que estrutura o sistema brasileiro, é o poder responsável por julgar e aplicar leis no nosso país. Contudo, apesar de sua imprescindível função exercida para o funcionamento do Estado Democrático de Direito brasileiro, o judiciário passa por diversas dificuldades, dentre elas, o afogamento do sistema, causando uma morosidade em sua estruturação que por vezes não consegue atender às demandas da justiça dentro do ritmo necessário.

Segundo a versão de 2020 do relatório “Justiça em números” disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça, no ano de 2019 existiam mais de 43 milhões de ações de execução, de cunho civil ou fiscal, em tramitação, representando um crescimento de 0,47% em relação ao ano de 2018. Esse cenário traduz uma taxa de congestionamento de 79,96%, indicador utilizado para demonstrar o percentual de casos pendentes de solução.

Esses dados ajudam a ilustrar o problemático cenário do sistema judicial brasileiro. A preocupação com a morosidade fortalece uma vertente que discute, há algum tempo, sobre a desjudicialização da execução. O movimento, apesar de pouco explorado na doutrina nacional, já é abraçado por diversos países e, mais recentemente, tornou-se pauta no Senado Federal por conta do Projeto de Lei n.º 6204/2019 proposto pela senadora Soraya Thronicke (PSL/MS).

A desjudicialização consiste no ato de deslocar algumas atividades que antes eram atribuídas ao Poder Judiciário para órgãos regulamentados, por meio de procedimentos administrativos. O Projeto de Lei propõe, em poucas palavras, que o Estado-juiz, por delegação, transfira aos tabeliães de protesto (denominados na PL como agentes de execução) os atos atinentes aos procedimentos executivos.

Na prática, a execução seria da seguinte forma: o credor, munido de título executivo judicial ou extrajudicial, e, representado por advogado, apresentaria um requerimento ao tabelionato de protesto, onde seria formado um instrumento a ser cumprido pelo agente de execução, a quem incumbiria a citação do devedor para pagamento em 5 dias, sob pena de penhora, arresto e alienação, concluindo-se o feito com a obtenção da satisfação do crédito, sem prejuízo da possibilidade de autocomposição.

Assim, o agente de execução conduziria todo o procedimento, e, somente quando necessário, consultaria o juiz competente sobre dúvidas suscitadas pelas partes ou por ele próprio, podendo, ainda, requerer eventuais providências coercitivas.

A proposta, que toma por base o exitoso modelo português, acompanha a dinâmica buscada pelos legisladores no contexto da simplificação de resoluções de conflitos voltado à realização do direito material mediante a efetiva satisfação das pretensões dos jurisdicionados, tirando do Poder Judiciário a mera função de “administrador de cobranças”, como têm-se no atual modelo adotado.

É válido frisar que o Projeto de Lei não impede o controle do Poder Judiciário em relação aos atos executivos, sempre que provocado pelas partes ou pelo denominado agente de execução. Portanto, embora desjudicializada, a execução deve continuar sob o controle e a fiscalização dos magistrados.

O projeto de lei segue a mesma linha de raciocínio de outros institutos que foram desjudicializados e obtiveram êxito por meio da autocomposição e solução de conflitos através de vias extrajudiciais e atos meramente administrativos, a exemplo da retificação do registro imobiliário do (Lei n.º 10.931/2004), do inventário, da separação e do divórcio (Lei 11.441/2007), da retificação de registro civil (Lei n.º 13.484/2017) e da usucapião (art.1.071 – LRP, art. 216-A)

Entretanto, diferente do previsto no Projeto de Lei que busca a desjudicialização do processo de execução civil, os exemplos acima citados tratam, em verdade, de procedimentos consensuais, onde há concordância de todos os envolvidos, realidade bem diversa da encontrada quando se analisa a complexidade que paira sobre o processo de execução.

Nessa vertente, o projeto de desjudicialização do processo de execução se mostra uma figura híbrida que transita entre atos consensuais (realizados pelo tabelião) e não consensuais, reservando ao juiz estatal a eventual resolução de litígios. Sendo assim, as partes estarão sempre representadas por advogados em todos os atos executivos extrajudiciais, respeitadas as regras processuais gerais e da execução, inclusive para a fixação da verba honorária; os litigantes hipossuficientes gozarão dos benefícios da gratuidade.

A iniciativa é disruptiva e carrega consigo um enorme potencial desburocratizante, sendo adequado e imprescindível para combater, eficazmente, a crise em que se encontra mergulhada a jurisdição estatal. Mas, como qualquer obra humana, não se encontra imune a críticas e sugestões. Fato é que se percebe cada vez mais que a desjudicialização da execução, desde que sem lesão as garantias processuais constitucionais, é um movimento necessário em prol do descongestionamento do Poder Judiciário e consequente outorga de maior celeridade e efetividade processuais.

Compartilhar

Facebook
Twitter
E-mail

Artigos Relacionados